Friday, March 14, 2008

 
08-03-2008

A BELEZA DA BATALHA


E não pretende o autor com este título, glorificar a guerra e todas as suas nefastas consequências. A batalha de que aqui se fala, é a aquela que semana após semana prende milhares de espectadores às suas televisões e aos seus assentos nos estádios, e que adquire um sabor especial quando é encarada da forma como Mânfios FC e Força Bruta o fizeram no passado sábado.
Que jogo, meus amigos! Que emoção! Assistiu-se a um verdadeiro clássico, um embate de titãs, e denotado desde logo pelas formações que deram entrada no campo. Chica, Huga, João, Rodrigues, Bruno, Murta, Finíssimo e Golias pelos manfiosos e Sotor, Carlos, Aranhiço, Simão, Miguel, Tiago, Paulo e Ukraniano pelos brutenses, fizeram o público saltar das cadeiras assim que entraram no rectângulo de jogo, pois a partir desse momento, todos os espectadores ali presentes sabiam com toda a certeza que iam assistir a mais um momento histórico na vida deste campeonato. Até porque da última vez que as duas equipas se tinham defrontado utilizando estes alinhamentos, o resultado tinha sido uma pesada derrota por 10-1 para os Manfiosos, coisa que os jovens jogadores da casa não pretendiam que voltasse a acontecer. E assim foi.

O jogo começou rápido e intenso, mas nunca como no passado sábado se tinha esperado tanto tempo para se ver as redes de uma das balizas a mexerem. Foram largos minutos sem que uma das equipas rematasse à baliza, e poucas as jogadas de ataque dignas desse nome. O MFC surpreendeu o adversário com a táctica utilizada, jogando com Huga, Murta e Chica na defesa – coisa até aqui nunca vista -, Golias sozinho no meio campo e Finíssimo e Bruno executando uma pressão sufocante no sector defensivo dos brutenses, com João a ser o terceiro vértice (recuado) do ataque da sua equipa. A opção provou-se acertada, e durante muito tempo o Mânfios FC conseguiu manter bem afastados da sua baliza Carlos, Tiago e Simão, ao mesmo tempo que colocava em apuros a baliza de Aranhiço. Ao fim de muito tempo, e por intermédio de Finíssimo - grande jogo – surgia o primeiro golo, nascido de uma das inúmeras falhas defensivas brutenses. Bola perdida ao meio campo, progressão rápida de João, desmarcação de Finíssimo e remate imparável para o fundo da baliza de Aranhiço. Simples, concreto e terrivelmente eficaz. A mudança radical operada no seio da equipa manfiosa desnorteava o adversário e colhia rapidamente os seus primeiros frutos. O 2-0 não levaria muito tempo a surgir, e numa altura em que tudo corria mal aos brutenses – maus passes, perdas de bola infantis, jogadas de ataque absolutamente descoordenadas -, haveria de ser Aranhiço a colocar a cereja no topo de bolo, com um daqueles frangos que fazem as delícias de quem se dedica a vender vídeos das situações mais cómicas do desporto. Num canto marcado por Finíssimo, e em que a bola foi desviada pelo forte vento que se fazia sentir, Aranhiço tentou segurar o esférico e acabou por introduzi-lo na sua baliza. Foi um lance ridículo, nascido de uma jogada absolutamente controlada e sem significado, já que no momento em que o avançado manfioso apontou o canto, não estava nenhum colega seu na área brutense.

O lance teve no entanto algumas propriedades terapêuticas, já que serviu para espicaçar os jogadores do FB. Começaram a trocar melhor a bola, e a adaptarem-se melhor ao modelo de jogo apresentado por Chica e companhia. Nessa altura Tiago e Miguel voltaram a ser as figuras de maior relevo, até porque Carlos começava a transparecer a ideia de mais um jogo de má qualidade. O resultado foi reduzido para 2-1, e quando os brutenses começavam a querer mandar no jogo, uma nova falha defensiva deu o terceiro golo ao adversário. 3-2, 4-2, 4-3, 5-3, 6-3, foi esta a marcha do marcador em não mais do que dez minutos. O jogo tornava-se endiabrado, pleno de tensão e suspense e marcado por inúmeras oportunidades de parte a parte. A cada golo esperançado do FB, respondia o MFC com outro, carrasco. Foi nessa altura que Aranhiço se começou novamente a evidenciar, impedindo que o Mânfios disparasse para um resultado mais pesado e, de certa forma, injusto.

Foi nessa altura também, que os brutenses começaram a jogar futebol a sério; quando se aperceberam do que era necessário fazer para contornar a táctica aparentemente impenetrável do adversário e, finalmente, chegar à baliza com mais facilidade. Num ápice deram a volta ao marcador e colocaram-se espantosamente na frente por 8-6. Tiago e Miguel partiam a defesa contrária, Sotor começava por fim a fazer um jogo ao seu real nível, e até Simão – até então com uma exibição perfeitamente desastrosa -, motivado pelo novo fulgor dos seus companheiros, contribuiu para um súbito desequilíbrio e para a conquista dos tais dois golos de diferença.
Com a fuga rápida do FB no marcador, o treinador manfioso viu-se obrigado a mexer na táctica e mandar Huga e Chica para a frente, fazendo subir Golis para o centro do ataque, ficando Murta como único responsável das tarefas defensivas. A manobra era arriscada, e a saída de Finíssimo, que tinha prestado um grande serviço à equipa, pressionando e colocando em sentido permanente a defesa brutense, vinha complicar ainda mais a manutenção do meio campo. A equipa voltou a equilibrar o rumo dos acontecimentos, mas sem verdadeiramente ameaçar o andamento do marcador.

Pelo lado do FB era Carlos quem cedia ao cansaço e se retirava mais cedo para os balneários. Apagado, autor de um golo apenas, Carlos foi importante para a incrível batalha campal que se desenrolava no centro do campo. Lutou, roubou bolas, foi literalmente à luta, mas falhou naquilo que mais se espera de si: os golos. E a sua saída, embora sempre motivo de preocupação, acabou por ser o tónico que empurrou os jogadores do FB para uma recta final do encontro verdadeiramente brilhante. Sem Carlos no centro do ataque, os jogadores que normalmente o servem, Sotor, Miguel e Tiago, começaram a trocar a bola e a imprimir uma velocidade estonteante ao seu futebol, e Simão, descaído na direita, era o elemento que servia a grande área ou que, através de diagonais bem desenhadas, trocava as voltas à defesa manfiosa. O meio campo estava completamente controlado, graças ao jogo sobre-humano de Sotor, Tiago voltava a abrir o livro e a fazer novamente uma dupla infernal com Miguel, Paulo e Ukraniano dominavam a defesa e Aranhiço voltava a ser influente na manutenção do resultado.

Apesar de um último esforço manfioso, o resultado de 9-8 a favor do FB não haveria de sofrer alteração. O resultado aceita-se, mas o empate era bem mais justo. As duas equipas tiveram o mesmo tempo de posse de bola, ambas dividiram, a seu tempo, o domínio dos acontecimentos, gozaram do mesmo número de oportunidades de golo e desempenharam da mesma forma um futebol bonito, empolgante e fantasista. A arbitragem foi caseira, como diz o povo, e beneficiou e de que forma os jovens jogadores do MFC. Poderia ter estragado o espectáculo, mas acabou por representar somente um acidente de percurso.

Individualmente, convém falar de forma sucinta do desempenho dos jogadores. Sotor começou o encontro mais uma vez de uma forma morna e apagada. Desconcentrado, começou por perder demasiadas bolas ao meio campo, colocando a defesa sempre em sérios apuros. No entanto, e assim que encontrou uma posição fixa no campo, começou a dar tremendas dores de cabeça aos avançados manfiosos, travando duras batalhas com Chica, João e principalmente com Huga. Sotor foi um verdadeiro guerreiro sedento de sangue, nunca desistindo dos lances e sempre com a frente de ataque bem em vista; ajudou, pelo lado direito, a desenhar boas jogadas ofensivas, e chegou mesmo a marcar um golo – um dos mais bonitos, diga-se. Carlos voltou a estar apagado, e, ironicamente, ajudou mais a sua equipa quando saiu do jogo, deixando os seus colegas livres para atacar a baliza adversária sem estarem condicionados à sua presença. Simão foi durante largos minutos um jogador perdido e desastrado. Perdeu-se em confrontos pueris com Bruno, e ofereceu nada mais, nada menos, do que três golos aos avançados do MFC. Foi um dos elementos que ganhou com a saída de Carlos, e renasceu para o jogo na sua recta final, apontando dois bons golos e contribuindo decisivamente para a vitória brutense. Miguel, como todos os seus companheiros, teve um mau começo de jogo, mas ajudado por Tiago, voltou a fazer uma exibição memorável, lutando com Sotor pelo domínio do meio campo, roubando bolas e iniciando venenosos contra-ataques, e influenciando as jogadas ofensivas de forma absolutamente decisiva. Muitos dos golos apontados pelo FB saíram dos seus pés, sempre com intenção e teleguiados para Tiago ou Simão. Quando o MFC voltou à carga, na procura do golo do empate, Miguel foi importante para a defesa da grande área, interpondo-se por diversas vezes aos remates de João e Huga. Tiago foi novamente o jogador mais perigoso da sua formação. Perdido algures entre a defesa e o ataque, nos primeiros momentos do encontro, acabou por ser o primeiro brutense a sacudir o mau desempenho colectivo e a impulsionar a equipa na procura da baliza adversária. Marcou quatro golos, correu quilómetros, fez assistências e demonstrou uma clareza de raciocínio e de decisão que serviram para derrubar o bem montado esquema manfioso. Paulo e Ukraniano foram o que são sempre: uma muralha quase intransponível e bem organizada, onde todo o futebol brutense tem início. De facto, pouco ou nada há a acrescentar ao jogo destes dois defesas, que fazem com que todos os seus jogos sejam iguais em qualidade e eficácia. Aranhiço, como já referimos, não teve um arranque de partida feliz, mas conseguiu compensá-lo da melhor forma, ou melhor dizendo, da forma habitual. Fez defesas importantes, impedindo os golos que dariam aos adversários o empate ou mesmo a vitória, e mesmo no fim do encontro foi determinante para manter o resultado favorável à sua equipa.

Do lado contrário, e não pelas razões do costume, todos os jogadores do MFC tiveram um começo de partida verdadeiramente genial. Huga assumiu-se como patrão da defesa, coadjuvado e bem por Murta e Chica. É difícil falar dos três jogadores de forma individual porque a verdade é que os três executaram um soberbo jogo colectivo, pleno de esforço e abnegação. Juntos, eliminaram quase por completo todos os esforços dos adversários para se aproximarem da baliza à guarda de Rodrigues. Demonstraram uma segurança e um poder de encaixe que só tem sido visto pelas bandas do FB e nas pessoas de Paulo e Ukraniano. Foi também a partir dos pés de Chica e de Huga, que nasceram as principais jogadas de ataque manfiosas. Golias, fixo no meio campo, recebia o primeiro e rápido passe de um dos seus colegas recuados, e rapidamente fazia a bola chegar até Bruno ou Finíssimo. Esta rápida transição da defesa para o ataque baralhou por completo os jogadores brutenses, e teve o efeito de um poderoso estalo na cara. Ninguém do lado brutense conseguia construir uma jogada em condições, e as perdas de bola sucediam-se, muito por culpa do posicionamento de Golias e do seu esforço defensivo, mas substancialmente pela pressão sufocante movida por Finíssimo e Bruno ao sector defensivo do FB. Sem espaço para fazer mover a bola, os defesas brutenses viram-se muitas vezes obrigados a sacudir o esférico da sua grande área de qualquer maneira, não conseguindo dar início a jogadas bem construídas, com a lógica e coerência habituais. Os dois avançados manfiosos fizeram uma primeira parte maravilhosa, e desapareceram (infelizmente) do jogo quando Finíssimo teve de sair para os balneários, apoquentado que estava por uma pequena lesão. A partir daí, e já com Huga mais chegado à grande área adversária, Bruno voltou a cometer os erros do costume. Agarrou-se demasiado à bola, perdeu oportunidades flagrantes de servir colegas seus em melhor posição para chegar ao golo, e não conseguiu impedir o tal duelo ridículo com Simão, que não beneficiou o espectáculo e muito menos o futebol de ambas as equipas. Com o resultado desfavorável, também Golias e Chica decidiram arriscar e subir mais no terreno, na procura constante do golo. Com isso, perderam algum do brilhantismo anterior, e diluíram a sua habitual qualidade num estilo de jogo mais truculento e algo desorientado. João, esse, voltou a fazer um jogo de grande categoria. Manteve-se sempre ao nível a que já nos habituou, rematando sempre que podia, defendendo com unhas e dentes, nomeadamente à saída do ataque brutense. Foi sempre, e como já é costume, o jogador mais inconformado da sua equipa, mas, perante alguma desorganização colectiva em que os seus colegas incorreram, foi impotente para dar a volta aos acontecimentos. Rodrigues fez porventura o pior jogo do ano. Mesmo apoiado por uma muralha defensiva que não costuma existir, o veterano guardião teve um dia para esquecer, e permitiu alguns golos fáceis numa altura em que a sua equipa detinha uma importante e aparentemente garantida vantagem no marcador. Murta fez o que pode. Auxiliado por Chica e Huga, teve uma primeira parte tranquila e pouco teve de fazer para anular os adversários directos. Com a subida dos colegas no terreno, viu-se novamente a braços com o manancial atacante de Tiago e companhia. Nessas circunstâncias nada podia fazer para os impedir, e teve de recorrer várias vezes à falta para travar jogadas perigosas para a sua baliza.

Portanto, o campeonato mantém a qualidade e intensidade que vêm marcando as últimas jornadas, e os próximos embates entre os dois colossos do futebol nacional prometem novas emoções e a magia de um futebol bonito e pleno de intenção. A perspectiva do regresso aos relvados de Joel deixa antever um acréscimo de segurança para o sector defensivo do FB, enquanto que a inovadora táctica utilizada pelos jogadores manfiosos na primeira parte do jogo deixa duas questões interessantes: porque não conseguiu a equipa manter esse esquema de jogo até ao fim, e se voltará a utilizá-lo nos encontros que aí vêm. As respostas poderão surgir já no próximo clássico, sábado, dia 15 de Março, no local do costume.

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