Wednesday, January 16, 2008

 
O sol tentava eliminar à pressa as marcas da chuvada da véspera, o vento afastava as nuvens para que não incomodassem, a terra esforçava-se por absorver a água remanescente... eis como toda a natureza se dedicava para transformar um campo de terra enlameado no palco de mais um espectáculo intenso, que perdeu (pelos obvios condicionalismos meteorológicos) qualidade mas devolveu a emoção que se adivinhava desaparecida após a ascenção meteórica do poderoso MFC ao topo da tabela qualificativa. É inconsciente pensar que a queda duma pedra num rio possa mudar o seu curso, mas, quando estas se sucedem, o rumo dos acontecimentos pode sofrer uma reviravolta. Só o futuro dirá o que este campeonato nos reserva. Nuno Matos, o profeta, trás-nos mais uma crónica



ARMA SECRETA


“O campeonato está ao rubro”. Foi com estas palavras que Chica deu início à conferência de imprensa que se seguiu a mais uma emocionante partida do campeonato, no passado Sábado. Minutos antes, o encontro entre Força Bruta FC e Mânfios FC tinha terminado com uma vitória para os da casa; uma vitória difícil e surpreendente, mas justa e facilmente explicável.
Os últimos resultados de Sotor e companhia faziam prever mais um desaire, frente a uma jovem e bem preparada formação manfiosa. O futebol do MFC tem-se apresentado cristalino, objectivo e repleto de opções atacantes válidas e eficazes. Pelo contrário, o jogo do FB é morno, mastigado, feito aos empurrões e claramente sem ideias. Depois de um arranque fulgurante no campeonato, a equipa baixou inacreditavelmente de forma, e tudo fazia querer, perante a esmagadora recuperação dos manfiosos, que a tendência perdedora era para continuar.
Só que os brutenses tinham uma inesperada arma secreta; uma arma para a qual os meninos-jogadores do MFC não estavam preparados. No sábado passado, e perante o seu público, o FB alinhou com Aranhiço, Paulo, Jorge, Manuel, Sotor, Bruno, Carlos e uma incrível e poderosa vontade de ganhar. Esta foi a sua arma secreta, e o pormenor que eclipsou as habituais fraquezas da equipa - e que, mais uma vez, estiveram bem patentes em variados momentos do jogo – e que serviu para trocar as voltas a Chica, Huga, Murta, Golias, Nunes, Filipe e João.

O jogo começou lento e algo confuso, com sucessivas perdas de bola e zero oportunidades de golo para ambas as partes. O primeiro tento surgiria, por volta dos dez minutos, de mais um lance individual de João, que ao converter um remate de um ângulo pouco usual, inventou mais um daqueles lances só ao alcance de poucos. Em seguida 2-0 por Nunes, e a rápida reviravolta no resultado, através de pontapés certeiros de Bruno e Carlos. Passados poucos minutos os da casa encontravam-se na posição de vencedores e já por uns claros 5-2. Mesmo não jogando bem, e com claras dificuldades em transportar a bola para a frente, a verdade é que os brutenses detinham o domínio do jogo e a sua defesa continuava a mostrar-se implacável, mesmo dando enormes facilidades nos lances em posições frontais à baliza de Aranhiço. Não se compreende tanta falta de discernimento e de comunicação entre alguns jogadores do FB. É claro, para todos os que acompanham este campeonato, que Paulo é o defesa esquerdo e Jorge o defesa direito da sua equipa. Ou seja, faltando Joel, que normalmente ocupa o eixo da defesa, parece-nos claro que alguém deverá obrigatoriamente recuar para essa posição. Ao invés, o que diversos jogadores brutenses fizeram no jogo passado, foi atropelar literalmente os seus colegas das alas, atrapalhando o seu desempenho, e deixando o centro do ataque manfioso completamente à vontade para bombardear Aranhiço. É perfeitamente inacreditável esta falta de compreensão do jogo defensivo, principalmente quando se torna audível o protesto contínuo de Aranhiço, um guarda-redes habitualmente atento às movimentações do adversário e que tudo faz para melhor orientar os seus colegas de defesa. Nem assim. Entre a grande área brutense e a área manfiosa, existia um enorme deserto de ideias. O meio campo, formado por Manuel e Sotor, não se entendia com a defesa, ao mesmo tempo que não conseguia criar forma de fazer a bola chegar aos seus avançados, obrigando muitas das vezes Carlos e Bruno a pegarem no esférico bem cá atrás e a terem de cavalgar pelo território inimigo em busca de mais um golo. Sotor fez, desta feita, um jogo mais inspirado e esclarecido, mas foi constantemente perturbado por Manuel, um jogador que confunde a força de vontade com truculência e que acaba por prejudicar a sua formação. Solto de posição táctica, Manuel estava por todo o lado e ao mesmo tempo em lado algum; quis fazer muito, mas acabou por não fazer absolutamente nada. E assim seguia o futebol do FB, confuso, aos tropeções e mais em força do que propriamente em jeito.
Mas o que pode um crítico dizer quando uma táctica tão disparatada resulta? O querer vencer, o querer lutar e a vontade de não permitir ao MFC mais uma vitória fácil, ajudaram a equipa da casa a encaixar neste peculiar estilo de jogo, e a obter resultados com aparente facilidade. Os golos começaram a surgir com alguma naturalidade – e alguma sorte, diga-se – e a vantagem de dois golos era suficiente para manter a calma entre os jogadores do FB. E seria assim até ao término do jogo, mesmo apesar da boa réplica dada pelo MFC, que pouco antes do apito final ainda havia de reduzir para 9-7. Mesmo perante a pressão sufocantes dos últimos instantes, os brutenses souberam controlar a situação e terminar o embate numa posição em que já não se viam há demasiadas jornadas: vencedores.

Carlos, um pouco longe da sua forma habitual, foi um lutador implacável, nunca dando um minuto de descanso aos seus opositores mais directos. Pode não ter convertido tanto quanto o que lhe é habitual, mas foi determinante nas manobras ofensivas da sua equipa, nomeadamente ao servir com mestria Bruno, que com a sua ajuda marcou quatro dos nove golos brutenses. Teve ainda tempo para um golo digno do melhor dos circos, quando, servido por Aranhiço, deixou bater a bola duas vezs no chão e, sem ângulo, pontapear o esférico com um remate meio ballet, meio artes marciais, fazendo um monumental chapéu ao guarda-redes manfioso. Já não é a primeira vez que estes dois jogadores executam jogadas destas, mas nunca nenhuma com uma finalização tão espectacular. Sotor, já se disse, voltou a fazer um bom jogo, mas só conseguiu exibir o seu habitual nível em zonas mais ofensivas, já que ao meio campo viu o seu trabalho boicotado pela atrapalhação de Manuel, e na defesa, pouco habituado à posição a que foi remetido, falhou várias vezes a marcação ao homem mais avançado do MFC. Ainda assim, fez um jogo agradável (embora desequilibrado) e que assinou com mais um (bom) golo. Numa jogada típica da sua famosa raça, Sotor disputou a bola com Murta, que a chutou contra o rosto do veterano jogador. Teve sorte, a bola ressaltou para as costas do defesa manfioso, mas foi também lesto em remetê-la para o canto mais afastado do guardião adversário. Foi um verdadeiro golo à la Sotor, em força mas inequivocamente com mestria.
Paulo voltou a ser inultrapassável no lado esquerdo da sua defesa. Lutou com todas as armas que dispõe, e não se lhe pôde apontar uma falta. Visivelmente mais entrosado com Carlos, fez por diversas vezes de «número 10», iniciando rápidos contra-ataques e rematando sempre que teve hipótese. Jorge teve um início de encontro cheio de trabalho, já que a equipa manfiosa insistia em atacar pelo seu lado, mas respondeu sempre com elevado índice qualitativo, não dando grandes hipóteses a Nunes e a Huga. Desapareceu um pouco de jogo com a mudança de táctica do MFC, mas foi sempre (e novamente) uma pedra importante na manutenção do resultado. Aranhiço, por sua vez, fez mais um jogo brilhante. Não teve quaisquer responsabilidades nos golos sofridos, e voltou a evitar uma verdadeira chuva de potenciais tentos. Foi inteligente na forma como compreendeu que pelo chão a bola dificilmente avançava para o meio campo contrário, e foi eficaz na forma precisa como, por diversas vezes, colocou a bola nos seus avançados. Esteve a milímetros de defender uma grande penalidade, e fez uma defesa milagrosa a remate portentoso de Chica.

Em resposta à eficácia brutense, o MFC jogava como sempre o faz. Boa troca de bola, rapidez e desenvoltura no desenhar das jogadas, e uma poderosa capacidade de evoluir no terreno de jogo com a bola controlada. Falhou naquilo em que não podia falhar: a concretização. Vários foram os lances em que o golo era mais do que certo, e que foram desperdiçados pelos atacantes manfiosos. Golias, Filipe e Nunes falharam em demasiadas ocasiões para que a sua equipa pudesse ter uma real pretensão à vitória final. Ou porque Aranhiço se interpunha com valentia entre os remates e a sua baliza, ou porque pura e simplesmente os jovens atletas não sabiam dar o melhor caminho ao esférico. O facto assume ainda maior relevância dada a facilidade com que ganhavam posição privilegiada dentro da área do adversário. Mas o futebol é mesmo assim, nem sempre corre como o jogador pretende.
Chica esteve algo apagado e quase sempre ausente das manobras ofensivas da equipa. Sozinho na defesa – por culpa de um Murta aparentemente cansado e desconcentrado –, foi obrigado a correr o dobro para cobrir Bruno e Carlos, que inspirados não lhe deram um momento de sossego. João foi o guerreiro do costume, coerente, batalhador e inconformado, mas incapaz, também ele, de marcar os golos necessários à manutenção do equilíbrio no resultado. Nunes, Golias e Filipe, como já aqui se disse, estiveram em dia não, e pouco ou nada aportaram ao futebol manfioso. Nunes voltou a perder-se em fintas desnecessárias, Filipe nunca foi capaz de encontrar a sua posição dentro do campo, e Golias mostrou-se perdulário como já há muito não se assistia. Restava um inconformado Huga, que visivelmente zangado com os seus colegas, fez um jogo de raiva, sendo o principal responsável, não só pela forma como o MFC se recusou a baixar os braços, como principalmente pelo último fôlego da sua equipa, ameaçando, nos últimos instantes da partida, uma vitória do FB quase certa. Apontou um dos golos mais bonitos do campeonato, quando fintou quase todos os adversários e rematou imparável à baliza de Aranhiço, e decorou a sua exibição com um punhado de jogadas plenas de beleza técnica. Não chegou para fazer frente ao jogo directo e objectivo dos da casa, mas valeu pelo esforço e pela combatividade. Em resultado disso mesmo, foi eleito o melhor jogador em campo, prémio mais do que merecido para o seu tremendo esforço.

Ou seja, se é verdade que o MFC exibiu novamente um jogo colectivo bonito, solto e alegre, não é menos verdade que denotou também algumas fraquezas pouco habituais, principalmente no campo onde normalmente a jovem equipa é mais forte: o ataque. Essas fraquezas foram inteligentemente aproveitadas pelo FB, que soube adaptar-se aos condicionalismos impostos pela falta de alguns jogadores predominantes, e recriar um estilo de jogo truculento, mas eficaz.
Sendo assim, as equipas voltam a estar igualadas no posto mais alto da competição, sendo a curta vantagem do MFC resultado da melhor relação entre golos marcados e sofridos (nove golos mais do que o FB).
Será que vamos assistir a mais um renascimento neste campeonato? Sotor e companhia parecem acreditar que sim e Chica e sus muchchos dizem que não. Ganha o futebol, ganha o público, que religiosamente se desloca aos estádios para acompanhar o campeonato, e ganham as instituições envolvidas.
No próximo Sábado esclarece-se a questão…

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